terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Dedal de vidro - parte 2



  Com o olhar fixo nos grãos de areia que tocavam nos seus pés descalços, disse:
  - Hoje acordei pela manhã e respirei como se fosse a primeira vez que os meus pulmões tivessem sentido o ar inspirado pela primeira vez. Comecei a chorar. Senti-me libertada de uma prisão interior, de uma prisão que não me deixava ver o que realmente eu precisava ver e que agora eu já não vejo mais…
  Não entendi nada o que ela me dizia, mas senti que estava de coração apertado e então, pedi-lhe para continuar.
  - Estive cega querida Ana! Cega durante o tempo que eu mais precisava de ver. Fui vítima de uma realidade que eu própria criei, uma realidade que não era a mesma de quem eu queria que a visse e por isso ela não a conseguia decifrar. Não fui vítima, nenhum de nós foi. Ambos fizemos os nossos erros, tivemos as nossas indecisões, as nossas dúvidas mas hoje...Descobri onde falhei! Falhei em lutar por ela nos momentos que ela mais precisava que eu lutasse. Falhei por querer quebrar laços por ver que estes estavam a ser postos à prova e por não os suportar com consciência, com maturidade. E dizia eu que era tão matura...!- refletia Mia, de olhos cheios de lágrimas prestes a verter - Por vezes procurava respostas para entender o porquê, o motivo que a tinha levado a fugir e a refugiar-se de mim e agora eu sei. Uma parte de mim sabe ou pelo menos tenta saber… - continuava.
  Abracei-a, vi como estava frágil ao saber a consequência dos seus atos, de tentar chegar ao seus porquês e por ter pedido respostas.
  - Agora sei o quanto fui injusta, o quanto eu queria respostas que realmente ele não me poderia dar. Mas o que me conforta neste momento é o facto de eu acreditar que ele neste momento se encontra bem. Está bem como nunca esteve! Está a viver uma experiência de vida que o deixa de certa forma realizado e que mesmo que eu quisesse dar-lhe uma experiência semelhante não lhe poderia dar. Não tinha como...Era injusto privar-lhe dessa felicidade, era injusto intrometer-me num mundo em que eu já não sou recebida de coração cheio. Não lhe desejo mal nenhum, de modo algum. Até pelo contrário. Desejo que ele vença e que ultrapasse todos os obstáculos que lhe surjam. - acabou por concluir de uma forma aliviada.
  Senti orgulho, orgulho nela e por ela. Senti que algo a perturbava e que ela o conseguiu superar pelos próprios meios. Vi naquela mulher, uma mulher que desejava ser amada e que não tinha sido, uma mulher que lutava por algo que não era seu, que não lhe pertencia e que, mesmo passado todo este tempo, conseguiu ver isso e ter a capacidade de se perdoar por ter falhado. Sabia que se este amor fosse o dela, ela iria lutar por ele. Talvez os seus erros possam ter sido úteis, para a fazer crescer.
  Agora sim, ela voltou a ser a Mia que eu conhecia. A Mia de olhos grandes e de sorriso encantador. Agora sim, ela sentia-se livre!


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